O matrimônio é uma instituição sagrada, estabelecida pelo próprio Deus desde o princípio da criação. São João Crisóstomo, em sua Homilia 20, nos ensina com clareza e profundidade a beleza, a ordem e a responsabilidade que envolvem essa união. Ele explica que o casamento não é apenas um acordo humano, mas uma realidade espiritual e divina, onde homem e mulher são chamados a viver em perfeita harmonia, conforme a vontade de Deus.
Deus Criou o Homem Primeiro, e Depois a Mulher, A Partir do Homem
A narrativa da criação nos mostra uma verdade profunda: Deus formou o homem primeiro e, somente depois, a mulher, extraída de sua própria carne. Isso não é um detalhe acidental, mas um sinal da hierarquia natural estabelecida pelo Criador. A mulher não foi criada separadamente, mas retirada do homem, simbolizando sua dependência e complementaridade. O homem, como cabeça, recebe de Deus a missão de conduzir, proteger e prover. A mulher, formada a partir dele, recebe a missão de auxiliá-lo, sendo sua companheira fiel.
São João Crisóstomo ressalta que essa ordem divina não diminui a dignidade da mulher, mas define seu papel dentro da estrutura familiar e social. Assim como a Igreja depende de Cristo, a mulher depende do homem. Essa harmonia, quando respeitada, gera uma ordem perfeita no lar e na sociedade.
Homem e Mulher: Uma Só Carne
Desde o início, Deus não criou dois seres distintos e independentes, mas um único casal, feito para ser uma só carne. Isso significa que a união do homem e da mulher no matrimônio é algo indissolúvel e profundamente espiritual. A mulher não foi tirada da terra, como o homem, mas do próprio corpo de Adão, indicando que sua natureza é unida à dele de maneira inseparável.
São João Crisóstomo ensina que essa unidade significa que tudo o que afeta um, afeta o outro. Se o homem negligencia sua esposa, ele destrói a si mesmo. Se a mulher resiste à ordem natural e quer competir com seu marido em autoridade, ela rompe a harmonia da casa. O matrimônio não é um campo de batalha, mas uma fusão de almas e corpos, onde cada um tem seu papel e sua dignidade assegurada.
A Mulher Depende em Tudo do Homem e Lhe Deve Obediência
A doutrina cristã sempre ensinou que a mulher deve obediência ao marido, assim como a Igreja é submissa a Cristo. Essa obediência não é uma escravidão, mas um reconhecimento da liderança masculina, ordenada por Deus para o bem da família. Quando a mulher reconhece essa ordem e a segue, ela encontra paz e segurança, pois está protegida pelo amor e pela força do seu esposo.
São João Crisóstomo exorta as esposas a confiarem na direção do marido e a não se rebelarem contra sua autoridade. O caos que vemos hoje na sociedade, com famílias desestruturadas e filhos sem rumo, nasce da recusa em seguir essa ordem divina. Uma mulher que desobedece seu marido mina a estabilidade do lar, enquanto aquela que o respeita e se submete com amor fortalece sua casa e a própria felicidade conjugal.
Na ordem divina do matrimônio, somente o homem é o chefe da casa. A esposa não foi criada para ser sua igual em autoridade, mas sua auxiliadora, como a Igreja se submete a Cristo. O casamento não é uma democracia onde ambos governam igualmente, pois isso inevitavelmente leva ao caos e à desordem. Quando duas forças disputam liderança, há conflito. Quando há apenas uma autoridade estabelecida, há paz. São João Crisóstomo ensina que a cabeça do lar é o marido, e a paz do casamento depende da aceitação dessa verdade. Assim como Cristo guia a Igreja sem rivalidade, o homem deve governar sua casa sem oposição.
O Homem Deve Amar e Prover Tudo para Sua Esposa
Mas essa autoridade masculina não é um direito arbitrário; ela vem com uma imensa responsabilidade. O homem não pode ser um tirano, mas um chefe amoroso, que cuida, sustenta e está disposto a dar sua vida pela esposa. Na mesma medida em que a mulher deve ser submissa, o homem deve ser generoso, caridoso e sacrificial.
São João Crisóstomo ensina que o amor do marido deve ser semelhante ao de Cristo pela Igreja, ou seja, um amor que se entrega completamente, que sofre, que se sacrifica pelo bem da esposa. O homem que nega seu dever de sustentar, proteger e guiar sua família falha gravemente em seu papel. O verdadeiro esposo está sempre atento às necessidades de sua mulher, oferecendo-lhe não apenas bens materiais, mas também apoio emocional e espiritual.
O Dever do Homem de Nunca Abandonar Sua Esposa
A vocação do homem no casamento não é temporária, mas para a vida inteira. O matrimônio não é um contrato, mas um pacto sagrado, que exige compromisso inquebrantável. São João Crisóstomo nos ensina com palavras firmes:
“Nossa parceira para a vida inteira, a mãe de nossos filhos… Sofra tudo por causa dela, mas nunca a deixe em desgraça”.
Essa exortação mostra que o verdadeiro esposo nunca abandona sua mulher, mesmo diante das dificuldades. Ele deve suportar os desafios, lutar contra as adversidades e permanecer fiel até o fim.
O Homem Deve Cuidar de Sua Esposa Como Cabeça do Corpo
A união conjugal não é apenas uma parceria sentimental, mas uma unidade real, onde homem e mulher são um só corpo. Sendo o homem a cabeça desse corpo, cabe a ele liderar, proteger e cuidar de sua esposa com diligência e amor. São João Crisóstomo ensina que o chefe da casa não pode ser indiferente ao bem-estar da esposa, pois uma cabeça que despreza seu próprio corpo está condenando a si mesma. Assim como Cristo não despreza Sua Igreja, mas a sustenta e santifica, assim o homem deve fazer com sua esposa. Sua missão não é meramente mandar, mas guiar e conduzir sua família para a santidade e o bem-estar espiritual.
A mulher reverencia o homem como cabeça, e o homem a ama como o corpo.
Nenhum homem em sã consciência negligencia seu próprio corpo. Se há uma ferida, ele trata. Se há uma necessidade, ele supre. Se há dor, ele busca alívio. São João Crisóstomo utiliza essa analogia para mostrar que um marido que ignora as necessidades de sua esposa age contra si mesmo. Se a esposa sofre, ele deve ser o primeiro a consolá-la. Se ela está em dificuldade, ele deve ser seu amparo. Se ela erra, ele deve ser o primeiro a corrigir com paciência e amor. O verdadeiro chefe não governa com dureza, mas com solicitude, entendendo que sua missão é preservar a unidade e a saúde desse corpo que Deus lhe confiou.
O Amor Conjugal Como Força Poderosa
O amor entre homem e mulher não é uma simples inclinação natural, mas uma força ordenada por Deus para a construção da sociedade. Esse amor tem o poder de mover o homem a abrir mão de sua própria vida para proteger sua esposa e filhos. Ele não é egoísta nem interesseiro, mas busca sempre o bem do outro.
São João Crisóstomo ensina que o casamento bem ordenado é a base de uma sociedade justa e estável. Quando o homem ama sua esposa como Cristo ama a Igreja, e quando a mulher respeita e se submete ao seu esposo, o lar se torna um reflexo do próprio Céu. Dessa união harmoniosa nascem filhos bem formados, capazes de crescer na virtude e servir a Deus com fidelidade.
Eis uma das maiores provas do poder do amor: O homem, ao se casar, deixa o lar onde foi criado, as pessoas que o formaram e o acompanharam por toda a vida, para unir-se intimamente a uma mulher que, muitas vezes, conhece há pouco tempo. Esse fenômeno não é obra do acaso, mas um desígnio divino. É a força do amor, planejada por Deus desde a criação, que faz com que essa união seja indissolúvel. E porque esse amor é tão forte, o homem deve não apenas prover para sua esposa, mas também honrá-la e tratá-la com dignidade, como um tesouro precioso confiado por Deus aos seus cuidados.
Mesmo que a Mulher seja Má, o Homem deve cumprir seu Dever, e Vice-Versa
O matrimônio cristão não é um contrato de conveniência, onde um cônjuge só cumpre seus deveres se o outro fizer o mesmo. O amor verdadeiro, ensinado por Cristo e explicado por São João Crisóstomo, não é condicional. O homem deve amar sua esposa mesmo que ela não o respeite, e a mulher deve respeitar seu esposo mesmo que ele não a ame. Essa entrega incondicional é um reflexo da própria relação de Deus conosco: Ele nos ama e nos chama à santidade, mesmo quando somos indignos desse amor. Quando um cônjuge cumpre seus deveres independentemente da resposta do outro, há uma chance real de conversão dentro do próprio matrimônio, pois a fidelidade ao dever transforma os corações. O mandamento que recai sobre o homem não é leve, mas gravíssimo. Não se trata apenas de ser um provedor material, mas de amar sua esposa com a mesma intensidade e sacrifício com que Cristo amou a Igreja. Cristo morreu por sua Esposa, a Igreja, e o homem deve estar disposto a dar sua vida por sua esposa. Esse amor não é opcional, não depende do comportamento da esposa; ele é um dever divinamente estabelecido. Quando um homem falha em amar sua esposa, ele não apenas destrói sua família, mas peca contra Deus, pois negligencia um mandamento sagrado.
O Temor é Reflexo do Amor e do Respeito
A obediência e o respeito que a esposa deve ao marido não são frutos de uma submissão forçada, mas de um temor reverencial, que nasce do amor profundo e da consciência de que ele é sua cabeça. No matrimônio ordenado por Deus, esse temor não é o medo servil de um escravo para com um senhor, mas a reverência e a consideração que um corpo deve à sua cabeça. Quando a esposa vê em seu marido um homem justo, virtuoso e temente a Deus, esse respeito se manifesta naturalmente. São João Crisóstomo enfatiza que o amor deve prevalecer sobre o temor, pois quando há amor verdadeiro, todas as obrigações conjugais são cumpridas com alegria e não com ressentimento.
São João Crisóstomo deixa claro que o amor verdadeiro remove a necessidade do medo. Quando o marido ama corretamente, ele não precisa se preocupar em forçar a submissão de sua esposa, pois o próprio amor fará com que ela naturalmente o respeite. Essa é a essência do matrimônio bem-ordenado: o marido guia e protege, a esposa respeita e segue, mas ambos estão unidos pelo amor, que é a força central da união conjugal. Se um esposo deseja que sua esposa o respeite, que ele comece amando de forma incondicional, pois o amor é o maior poder para transformar os corações.
A mera citação do imenso parágrafo de São João Crisóstomo já bastará para abordar o tema com amplitude e potência suficientes.
“Ame sua própria carne como Cristo ama a Igreja, e para que a esposa respeite o marido. Paulo não está mais enumerando apenas os deveres do amor, mas também os do respeito. A esposa é uma segunda autoridade. Ela não deve exigir igualdade, pois está sujeita à cabeça; nem o marido deve fazer pouco da sujeição da esposa, pois ela é o corpo. Se a cabeça despreza o corpo, ela própria morrerá. Em vez disso o marido deverá contrapor seu amor à obediência da esposa. Que as mãos, os pés, e todo o resto das partes do corpo se dediquem ao serviço da cabeça; mas a cabeça deverá cuidar do corpo, pois a cabeça é responsável por todos os membros. Nada é melhor que uma união assim, mas eu conheço alguns que dirão: ‘Como pode haver amor quando há temor?’. Aqui especialmente eu digo: aquela que teme, também ama, e aquela que ama o marido o respeita porque ele é sua cabeça. Ela também o ama porque ele é parte do seu corpo, já que a cabeça também é membro do corpo. Paulo coloca a cabeça como autoridade e o corpo deve obedecer para que haja paz. Quando a autoridade é igual, nunca há paz. Um lar não pode ser uma democracia governada por todos, mas a autoridade deve necessariamente ficar com uma só pessoa. O mesmo é verdade no caso da Igreja: quando os homens são liderados pelo espírito de Cristo, então há paz. Havia cinco mil homens na Igreja de Jerusalém, e eles tinham um só coração e alma, e ninguém chamava de apenas sua qualquer coisa que possuísse, mas uns eram sujeitos aos outros; essa é certamente uma ilustração de sabedoria e temor de Deus. Observa, no entanto, que Paulo explica o amor em detalhes, comparando-o com o amor de Cristo pela Igreja e nosso amor por nossa própria carne, dizendo que por esse motivo um homem abandona pai e mãe, mas ele não elabora o tema no que diz respeito ao temor. Por quê? Seria preferível a Ele que o amor prevalecesse, porque, onde há amor, tudo o mais procede naturalmente, mas onde o amor está ausente, o temor não servirá de nada. Se um homem ama sua esposa, ele a suportará mesmo quando ela não é muito obediente. Quão difícil é obter harmonia quando marido e esposa não estão unidos pelo poder do amor! O medo não substitui o amor. É por isso que Paulo fala mais detalhadamente sobre a força mais potente. Assim, se pensas que a esposa é a perdedora porque a ela se diz que tema o esposo, lembra que o principal dever do amor é designado ao marido, e tu verás que isso é para proveito da mulher. ‘E se minha esposa se recusar a obedecer?’, algum marido pode perguntar. Não deves dar atenção a isso! Tua obrigação é amá-la, cumpre teu dever! Mesmo quando não recebemos o que é nos devido de outros, sempre devemos cumprir nosso dever. Eis aqui um exemplo: Paulo inicia esse trecho dizendo: Sede submissos uns aos outros no temor de Cristo. Se tua esposa não obedece à lei de Deus, tu não estás eximido de responsabilidade. A esposa deve respeitar o marido mesmo quando ele não demonstra amor para com ela, e o marido deve amar sua esposa mesmo quando ela não o respeita. Então veremos que a eles nada falta, já que cada um cumpre o mandamento que a eles foi dado”.
O Carinho entre os Esposos
O matrimônio não deve ser apenas uma convivência baseada no dever e na obrigação, mas também um espaço de carinho e ternura. A relação entre marido e esposa deve ser envolta em palavras gentis, gestos amorosos e demonstrações constantes de apreço. Um esposo que deseja uma esposa fiel e feliz deve tratá-la com afeição e respeito, mostrando-lhe que é valorizada e querida. Como ensina São João Crisóstomo:
“Finalmente, nunca a chame por seu nome apenas, mas com termos de carinho, honra e amor. Se a honrares, ela não precisará da honra de outros; ela não desejará louvores de outros se apreciar o louvor que vem de ti. Prefere tua esposa a qualquer outra companhia, por sua beleza e seu discernimento, e louva-a. Assim ela será persuadida a não escutar ninguém dos de fora, e a desprezar o mundo inteiro por tua causa”
O marido que honra e exalta sua esposa a torna segura e fortalecida no amor conjugal. Se ele a elogia e lhe dá a atenção devida, ela não buscará reconhecimento em outros lugares, e o lar se tornará um refúgio seguro de fidelidade e cumplicidade.
Dentro do matrimônio, marido e esposa devem ser ajudadores um do outro em todas as situações. O casamento cristão não é uma disputa de forças, mas um apoio recíproco onde cada um supre as necessidades do outro. O homem deve estar atento às dificuldades da esposa, oferecendo-lhe auxílio e proteção. Da mesma forma, a esposa deve ser solícita, ajudando seu marido em suas obrigações, seja no lar, na vida espiritual ou no trabalho. O amor se expressa também na capacidade de servir sem esperar algo em troca, imitando o amor de Cristo por Sua Igreja.
A mulher é o descanso e o refúgio do marido após suas lutas e trabalhos. Assim como o lar é um porto seguro em meio às tempestades da vida, a esposa deve ser a fortaleza onde o homem encontra consolo e repouso. O homem, por sua vez, deve retribuir esse amor com dedicação e gratidão. Quando um esposo sente que sua casa é um lugar de paz e sua esposa é um apoio fiel, ele se fortalece para enfrentar os desafios do mundo. A relação entre ambos se torna uma aliança inquebrantável, baseada no amor, no respeito e na confiança mútua.
O Verdadeiro Respeito e a Fragilidade Feminina
“E quando tu ouves Paulo dizer ‘temor’ ou ‘respeito’, pede o respeito devido a ti por uma mulher livre, não o temor que exigirias de um escravo. Ela é teu corpo; se a coagires, farás desonra a ti mesmo ao desonrar teu próprio corpo. O que significa esse ‘respeito’? Ela não teimará em te contradizer, e não se rebelará contra tua autoridade como se ela fosse a cabeça da casa; isso já basta. Se desejares mais respeito, deverás amar como és instado. Então não haverá necessidade de temer, o próprio amor fará tudo. O sexo feminino é fraco e precisa de muito apoio, de muita indulgência”.
O que São João Crisóstomo ensina aqui é de suma importância para a correta compreensão da submissão da esposa. Quando ele diz que o respeito que a esposa deve ao marido não é o temor servil de um escravo, ele está deixando claro que a autoridade do marido não pode ser tirânica. A mulher não é uma serva sem dignidade, mas um membro essencial do lar. O respeito que ela deve ao marido se manifesta na ausência de rebeldia e na aceitação da liderança masculina, e isso já é suficiente para manter a ordem no matrimônio. O marido não deve exigir mais do que isso de sua esposa, pois se ele quer ser respeitado para além dessa submissão devida, deve primeiro amar com toda a intensidade que lhe foi ordenada.
Por fim, São João Crisóstomo nos lembra de uma verdade incontestável: o sexo feminino é mais frágil e necessita de apoio e indulgência. Isso significa que o marido deve ser paciente, compreensivo e protetor, pois a esposa precisa de um ambiente seguro e estável para florescer. A mulher, por sua natureza, busca abrigo e segurança no marido, e cabe a ele proporcionar esse suporte com amor e generosidade. Um homem que entende essa verdade jamais será rude ou negligente com sua esposa, mas sempre agirá como um escudo contra as dificuldades da vida.
A virtude, pela nossa natureza caída, já é dificilmente alcançada. Mais difícil ainda é, porém, para as mulheres. O marido, portanto, deve ser exemplo de virtude, de resiliência, de temperança e de paciência.
Ciúme, Contendas versus Confiança e Paciência no Casamento
Existem cruzes e muitas situações indesejáveis no casamento, assim como na vida religiosa. Dentre elas, podemos citar as contendas, acusações, ciúmes e a necessidade da gentileza, da confiança e da paciência. Eis mais um trecho da Homilia:
“Essas palavras devem bastar para nos convencer a evitar brigas e desentendimentos. Nenhum marido deve acreditar em nenhuma acusação que ouvir de terceiros sobre sua esposa, e vice-versa; nem a esposa deverá monitorar as idas e vindas do marido, desde que ele sempre tenha demonstrado ser acima de qualquer suspeita. E se devotares o dia ao teu trabalho e amigos e a noite à tua esposa, e ainda assim ela não ficar satisfeita, exigindo mais do seu tempo? Não te aborreças com as reclamações, pois ela te ama, e não está se comportando de forma absurda; suas reclamações advém de sua afeição ardorosa por ti, e do medo. Sim, ela tem medo que seu leito conjugal seja roubado, que alguém a privará de sua maior bênção, que alguém tomará dela aquele que é sua cabeça.
Quando fores tentado ao ciúme pensa novamente na casa de Abraão e Sara. Quando Sara ainda era infértil, ela mesma pediu a Abraão que tomasse a serva Hagar como concubina. Foi ideia apenas dela; Abraão nem tinha sugerido algo assim, embora não tivessem filhos e já fossem bem velhos. Ele preferiu ser pai do que dar desgosto à esposa. No entanto, mesmo depois disso, o que Sara disse a ele quando Hagar deu à luz? O Senhor seja o juiz entre mim e ti (Gn 16,5). Se ele fosse outra pessoa, será que não teria se irritado? Será que não teria dito a ela: ‘Como assim? Eu não queria nada com essa mulher; tudo aconteceu por tua causa, e agora estás me culpando?’. Não, ele não disse nada do tipo, mas apenas: Eis que a tua escrava está em teu poder, usa dela como te aprouver (Gn 16,6). Ele abriu mão da mulher que compartilhara seu leito e que, portanto, tinha se tornado uma só carne com ele, para não dar desgosto a Sara; certamente ele dava mais valor à sua esposa do que a todo o resto. E ainda mais, Hagar estava carregando o seu filho. Que homem não se apiedaria da mulher que tinha acabado de dar à luz seu próprio filho? Mas o justo Abraão não se comoveu, e não deixou nada se sobrepor ao amor que devia à sua esposa. Imitemos sua paciência”.
São João Crisóstomo nos ensina aqui que a confiança e o respeito mútuo são essenciais para um casamento sólido. O marido não deve acreditar em calúnias contra sua esposa, e a esposa não deve suspeitar injustamente do marido. O ciúme excessivo destrói a paz do lar e envenena os relacionamentos. A verdadeira segurança no casamento vem da confiança e do amor profundo que ambos devem cultivar, em vez de se deixarem levar por desconfianças e suspeitas infundadas.
Além disso, Crisóstomo destaca que o amor conjugal genuíno exige paciência e compreensão. A esposa, por sua natureza mais emocional e delicada, pode ter medos e inseguranças, e cabe ao marido responder com carinho, não com irritação. Abraão nos dá um grande exemplo disso ao lidar com Sara: ele não se exalta, não acusa, mas age com sabedoria e paciência. Isso nos mostra que um marido verdadeiramente virtuoso sabe conter suas emoções e buscar sempre a paz e a unidade no lar.
Jamais levante a voz a mulher contra seu marido, principalmente se por motivos espúrios, como a falta de dinheiro ou outra ninharia terrena, cujas murmurações são indignas de um cristão, e bem próprias de pessoas imaturas e ímpias. E o homem, jamais abuse de sua autoridade para humilhar ou ofender a sua esposa. Ame-a; respeite-o.
O Papel do Homem Como Guia e Mestre de Sua Esposa
O matrimônio cristão não é apenas uma união baseada no afeto, mas também uma relação de aprendizado e crescimento mútuo. O homem, sendo a cabeça do lar, tem o dever de ensinar sua esposa, guiando-a nas verdades da fé e na prática das virtudes. Esse papel de mestre não deve ser visto como um peso, mas como uma missão sublime dada por Deus. Assim como Cristo instrui e purifica Sua Igreja, o esposo deve ser um orientador amoroso, ajudando sua esposa a crescer na santidade e na sabedoria. Ignorar esse dever significa negligenciar a própria responsabilidade como chefe da casa.
O marido que deseja ensinar sua esposa deve fazê-lo com carinho, humildade e simplicidade. Não basta dar ordens ou impor conhecimentos; é preciso que ela perceba que seu esposo a ama e quer o melhor para ela. A base dessa instrução deve ser a busca pelo Reino de Deus acima de tudo, pois, como o próprio Cristo disse, “buscai primeiro o Reino de Deus e a sua justiça, e todas essas coisas vos serão dadas por acréscimo” (Mt 6,33). Quando a esposa compreende que seu marido a conduz para Deus e não para caprichos humanos, ela se torna mais receptiva ao aprendizado e mais confiante em sua liderança.
“Ensina essas lições a ela com as outras que indiquei, mas usa de bastante compaixão. A vida virtuosa é difícil de seguir, então, sempre que tiveres de ensinar à tua esposa o significado da verdadeira sabedoria, lembra de falar de forma humilde, enche de graça e bondade as tuas palavras”.
Ensina-a também, nesse mesmo espírito e ações exteriores, esta sublime lição, a pedido do Santo:
“Acima de tudo, extirpa da alma dela essa noção de ‘meu’ e ‘teu'”.
Esse egoísmo (a separação dos bens, não legalmente, mas moralmente falando) corrói o casamento, pois na carne una não há separação. Diga a ela: Eu sou teu: tudo meu, é teu. Isso basta.
Na citação abaixo, São João Crisóstomo nos ensina que a educação da esposa não deve ser rígida nem severa, mas envolta em compaixão e paciência. A busca pela virtude é um caminho árduo, e o marido deve ser um companheiro compreensivo, não um ditador implacável. Quando a correção é feita com bondade e sabedoria, o coração da esposa se abre para a verdade e sua alma se fortalece para trilhar o caminho da santidade. Assim, o matrimônio se torna um instrumento de crescimento espiritual para ambos.
“Louva e mostra a admiração pelas boas ações que ela pratica; e se ela fizer algo tolo, aconselha-a com paciência”.
O marido deve ser o primeiro incentivador de sua esposa. Sempre que ela demonstrar virtude e prudência, ele deve elogiá-la e reconhecer seus esforços. O elogio sincero motiva a alma a perseverar no bem. Por outro lado, quando ela errar, a correção deve ser feita com paciência e delicadeza, nunca com dureza desnecessária. A humildade e o amor são as chaves para um casamento em que ambos crescem juntos, ajudando-se mutuamente a alcançar o Céu.
Ensine ela a temer ao Senhor, e todas as bençãos de Deus serão derramadas sobre sua casa.
O Casamento Como Caminho Para o Céu
O é um meio de santificação. O homem que ama sua esposa como Cristo ama a Igreja está seguindo um caminho de cruz, onde o sacrifício e a entrega moldam sua alma para a eternidade. A mulher que se submete ao marido com confiança e amor está espelhando a própria Igreja em relação a Cristo.
Quando o casamento é vivido conforme a ordem divina, ele se torna uma escola de virtudes. O casal aprende a paciência, a humildade, a renúncia ao egoísmo e a doação completa. Esse é o verdadeiro propósito do matrimônio: formar santos para o Reino dos Céus.
“Assim, devemos cuidar com bastante devoção de nossas esposas e de nossos filhos. Ao fazer isso, tornaremos mais fácil nossa obrigação de servir como cabeça. Assim teremos uma boa defesa diante do trono do julgamento de Cristo, e poderemos dizer: Aqui estou eu e os filhos que o Senhor me deu, como sinais e presságios em Israel (Is 8,8). Se o marido for admirável e a cabeça for sadia, então o resto do corpo não sofrerá dano. Paulo descreveu com precisão qual é o comportamento recomendado para marido e esposa: ela deve reverenciá-lo como cabeça, e ele deve amá-la como corpo. Mas como esse comportamento é alcançado? Que ele deve ser alcançado é claro; agora direi como fazer isso. Alcançaremos esse comportamento se nos desapegarmos do dinheiro, se nos esforçarmos acima de tudo para obter a virtude, se mantivermos o temor de Deus diante dos olhos. O que Paulo diz aos servos no capítulo seguinte também se aplica a nós: sabendo que cada um receberá do Senhor a paga do bem que tiver feito (Ef 6,8). Não ames tua esposa tanto por causa dela, mas por causa de Cristo. É por isso que ele diz: sujeitai-vos (…) como ao Senhor. Faz tudo por causa de Deus, em espírito de obediência a Ele.”
São João Crisóstomo reforça que a liderança do marido sobre a família não é apenas um privilégio, mas uma obrigação séria que será julgada por Deus. O homem que negligencia sua esposa e filhos não terá desculpa diante do trono divino. Um lar onde o marido assume seu papel de cabeça com responsabilidade e temor a Deus floresce e se torna um reflexo da ordem celestial. O segredo para um casamento bem-sucedido, segundo Crisóstomo, não está em riquezas ou conforto material, mas na busca incessante pela virtude e na fidelidade ao Senhor. Quando o marido governa sua casa com justiça e amor, sua esposa e filhos seguem naturalmente sua liderança, e a paz reina no lar.
Se os filhos tendem a ser como os pais, como não serão os filhos deste feliz casal!
O Exemplo do Lar de Abraão
“Considera Abraão, Sara e Isaac e os trezentos e dezoito homens nascidos em casa. Aquele era um lar unido em harmonia e santidade, uma ilustração perfeita do preceito apostólico. Sara respeitava o marido; eis as suas palavras: Depois que sou velha, e meu senhor avançado em anos (Gn 18,12). Ele a amou por sua vez e sempre fez o que ela pedia. O filho deles era virtuoso, e seus servos eram tão leais que voluntariamente arriscaram as próprias vidas pelo mestre, sem perguntar por quê. O primeiro entre os servos era tão admirável que lhe foi confiado arranjar o casamento de Isaac, e ele teve de partir em uma longa jornada. Assim como no caso de um general cujas tropas são tão bem organizadas no front que o inimigo não consegue encontrar um lugar para penetrar com seu ataque, da mesma forma é com o marido e a esposa: quando as preocupações de todos na casa são as mesmas, a harmonia reina na família, mas se isso não acontece, todo o lar se esfacela facilmente e é destruído”.
O lar de Abraão é um modelo de ordem, respeito e harmonia familiar. A relação entre Abraão e Sara baseava-se no amor e na submissão, garantindo estabilidade e bênçãos divinas. O respeito de Sara pelo marido e o amor de Abraão por sua esposa criaram um ambiente de unidade que influenciou até os servos e os filhos. Essa estrutura de autoridade e obediência não era opressiva, mas funcional e benéfica, resultando em fidelidade e coesão dentro da casa. O exemplo de Abraão nos ensina que um lar bem estruturado, onde cada membro entende e cumpre seu papel, torna-se uma fortaleza impenetrável contra as forças que tentam destruir a família.
Por fim, é muito salutar citar:
“Lembrai um ao outro de que nada na vida deve ser temido exceto ofender a Deus. Se teu casamento for assim, tua perfeição rivalizará com o mais santo dos monges”.
A Necessidade de Restaurar o Verdadeiro Casamento Cristão
Nos tempos atuais, a visão do casamento está profundamente deturpada. O feminismo, o egoísmo e a busca desenfreada por prazeres arruinaram a santidade do matrimônio. O que antes era um vínculo sagrado tornou-se um contrato frágil, facilmente rompido quando uma das partes não se sente mais satisfeita.
Cite-se também os terríveis males do divórcio, do uso de métodos contraceptivos, do assassinato em massa de crianças dentro do ventre, dos quais alguns casados fazem parte, cometendo infanticídio com seus próprios filhos.
Cite-se também os males do maldito Modernismo e sua caricatura de Igreja, com a sua perversa Teologia do Corpo, falsa Moral Matrimonial e seus tribunais de anulação de casamentos, incentivos indispensáveis para dar propulsão à onda de impiedade e degeneração, destruindo casamentos, vidas e condenando almas ao Inferno.
Precisamos retomar os ensinamentos da Tradição e restaurar a dignidade do matrimônio cristão. Isso significa que os homens devem reassumir seu papel de líderes e protetores, e as mulheres devem reencontrar a beleza da submissão amorosa e do respeito ao marido. Somente assim as famílias poderão recuperar sua força e a sociedade voltará a ser ordenada conforme a vontade de Deus.
Conclusão
A Homilia 20 de São João Crisóstomo nos oferece um ensinamento profundo sobre a natureza do matrimônio cristão. O casamento não é apenas uma aliança humana, mas um chamado divino onde homem e mulher se unem para se santificarem mutuamente. O esposo deve ser a cabeça do lar, guiando sua esposa com sabedoria, paciência e amor, enquanto a esposa deve se submeter e respeitar sua liderança, reconhecendo nele a autoridade estabelecida por Deus. Essa ordem, longe de ser uma imposição, é o alicerce para um lar harmonioso, onde cada um desempenha seu papel de acordo com a vontade divina.
Além disso, São João Crisóstomo nos ensina que o amor no casamento não pode ser condicional ou baseado em retribuições, mas deve ser firme e constante, independentemente das dificuldades que possam surgir. O marido deve amar sua esposa com a mesma intensidade com que Cristo ama a Igreja, oferecendo-se em sacrifício por ela, enquanto a esposa deve responder com respeito e confiança. A fidelidade, o carinho e a paciência são virtudes essenciais para a construção de um matrimônio sólido, onde ambos crescem juntos na fé e na santidade.
Por fim, a chave para um casamento bem-sucedido está no equilíbrio entre amor e respeito, onde o marido educa e cuida da esposa com ternura, e a esposa responde com submissão e honra. Quando ambos cumprem seus deveres, o lar se torna um reflexo da ordem divina, um refúgio seguro contra as tempestades do mundo e um caminho seguro para a vida eterna. Que os ensinamentos de São João Crisóstomo inspirem os casais cristãos a viverem segundo esse modelo, buscando sempre a vontade de Deus em seu matrimônio.
A.M.D.G.
